A sofisticada formação do profissional de satélites

“Em geral, não é fácil encontrar um bom profissional com a qualificação necessária para atuar na indústria de satélites”. Esta é a opinião de Mauro Wajnberg, conselheiro da Associação dos Profissionais de Satélites do Brasil – APSAT/SSPI Brasil, afiliada à SSPI Internacional. Mauro foi fundador da Associação tendo ocupado a presidência por 12 anos. Também é profissional do setor de comunicações por satélite há mais de 25 anos e nesta entrevista apresenta sua visão sobre o assunto. Como desenvolver e manter talentos? O que as empresas podem fazer nesse sentido e qual a responsabilidade de cada profissional pelo seu próprio desenvolvimento técnico? De que forma as transformações pelas quais essa indústria está passando pode atrair os jovens e quais são as novas demandas desse mercado? Acompanhe a visão de Mauro Wajnberg sobre todas essas questões a seguir. 

Abrasat NotíciasÉ difícil encontrar engenheiros ou outros profissionais técnicos para a indústria de satélites?

Mauro Wajnberg –  Em geral não é fácil encontrar um bom profissional com a qualificação necessária, devido a uma conjunção de fatores. Comparado com a demanda de profissionais para o setor de telecom como um todo, a comunicação por satélite é um nicho, então a quantidade associada de vagas é relativamente limitada, contribuindo para a escassez de profissionais. Além disso, é necessário que o profissional possua conhecimentos especializados. Por exemplo, no contexto das operadoras/prestadoras comerciais, a comunicação por satélite envolve diversos conceitos de telecomunicações, como propagação, comunicação de dados, técnicas de multiplexação, etc, ou seja, um amplo escopo de conhecimento. O domínio da língua inglesa também é necessário e no Brasil até mesmo isso pode ser um obstáculo para preencher determinadas posições.

ANCom um escopo tão amplo, como desenvolver novos profissionais nessa área?

MW – Na época da abertura do mercado no Brasil, o grande celeiro de profissionais técnicos foi naturalmente a Embratel, pois esta possuía excelentes quadros treinados e com experiência prática no setor, já que era a empresa que até então exercia o monopólio estatal nesta área. Isto não se limitou ao Brasil, vários profissionais brasileiros fizeram carreira no exterior, alguns na ativa até hoje, ingressando em operadoras satelitais estrangeiras na onda da privatização deste setor, ao final da década de 90. De lá para cá o cenário mudou bastante, uma nova geração de profissionais chegou ao mercado, sem experiência prévia com satélites mas com novas idéias e muito gás. Esses profissionais em geral aprenderam “na marra”, com a experiência prática em seus empregos e treinamentos pontuais, sendo que hoje diversos desses profissionais ocupam cargos de liderança no setor. As parcerias empresas/universidades, trazendo a teoria um pouco mais próxima da prática são ferramentas úteis para o desenvolvimento de novos profissionais. Nesse sentido, vale dar como exemplo o convênio que o Sindisat fez com o Inatel para que alunos dessa instituição pesquisassem a interoperabilidade do 5G com o meio satélite, isso renderá frutos pois serão jovens que ingressarão no mercado já com determinados conhecimentos na área. Em suma, o desenvolvimento profissional requer atualização constante, a tecnologia está em constante evolução e tendo isso em vista, é imprescindível a participação em treinamentos, seminários e congressos, onde além de adquirir novos conhecimentos, o profissional tem a oportunidade de trocar idéias e experiência com colegas.

ANO que as empresas de telecomunicações por satélite estão fazendo nesse sentido?

MW – Acredito que o aperfeiçoamento profissional deve ser responsabilidade da própria pessoa, não da empresa. O profissional é o dono de sua carreira e cabe a ele buscar preencher seus gaps e aprimorar sua formação. Certamente a empresa pode e deve fornecer treinamentos específicos relacionados a determinada tecnologia ou equipamento associado aos seus negócios, mas a espinha dorsal da formação cabe ao próprio profissional. Vale destacar aqui o trabalho sendo realizado pela SSPI, uma associação sem fins lucrativos cujo objetivo é auxiliar o profissional de satélite no desenvolvimento de sua carreira.  Os eventos da SSPI Brasil representam uma oportunidade ímpar de aperfeiçoamento ao profissional de satélite, inclusive àqueles que não são da área técnica. As empresas reconheceram a importância dessa missão e vêm apoiando a SSPI Brasil desde o início das suas atividades em 2006, sob a a forma de patrocínios, o que vem permitindo ao profissional de satélite brasileiro ter acesso a apresentações, debates e conteúdos de ponta a custos subsidiados, além de um formidável networking.

AN – E o que fazer para mantê-los?

MW – Retenção de talentos é desafio constante para os gestores, em qualquer setor de atuação. É necessário proporcionar desafios e objetivos cuja consecução irá implicar em senso de realização profissional. É preciso proporcionar chance de crescimento na carreira. Na área técnica, a oportunidade de se trabalhar com novas tecnologias e inovações também constitui relevante fator de retenção, e nesse ponto o setor satélite possui uma vantagem inerente.

AN De que forma as mudanças que estão ocorrendo nessa indústria (movimento New Space, 5G, etc) ajudam (ou atrapalham) na atratividade para novos profissionais?

MW – O movimento New Space ajuda, e muito. O setor satelital está sofrendo uma verdadeira revolução tecnológica, talvez a maior já ocorrida em sua existência. Players como Elon Musk (Space X) e Jeff Bezos (Amazon) foram atraídos por oportunidades no setor espacial e com isso estão trazendo um maior dinamismo ao setor. Os longos ciclos associados ao planejamento, lançamento e comercialização de um satélite tradicional darão lugar a ciclos mais curtos e rápidos. Em nível global, com o  advento dos novos projetos como constelações de órbita baixa, novos lançadores, antenas eletrônicas, etc, novas empresas já estão surgindo, e, a reboque, mais oportunidades profissionais para aqueles que estiverem preparados.

ANQuais serão as tendências para os próximos anos em termos de evolução da indústria e em termos do consequente tipo de perfil que mais será demandado?

MW – Por uma série de motivos, o advento das novas arquiteturas como satélites HTS e constelações LEO, vem reforçar uma tendência dos clientes buscarem soluções completas em vez de somente alugar a capacidade do satélite. Esse cenário valorizará o profissional que dominar o entendimento de uma solução fim a fim, incluindo o domínio das diversas tecnologias envolvidas, seja satélite, terrestre ou de redes híbridas IP.