A TV aberta via satélite (TVRO) vive um momento de transformação. Depois da substituição das antigas parabólicas de banda C por equipamentos em banda Ku, o próximo passo da evolução tecnológica é a micro regionalização dos sinais — um movimento que deve revolucionar o modo como o conteúdo e a publicidade são distribuídos em todo o território nacional. Esse foi um dos temas abordados durante a II SSPI Day 2025, realizada no último dia 6 de novembro.
No modelo tradicional, emissoras e redes nacionais transmitiam o mesmo sinal para todo o país, sem distinção de conteúdo entre as regiões atendidas por satélite. A nova geração de sistemas TVRO, porém, viabiliza a distribuição segmentada por região.
O resultado é a formação de microrregiões de audiência, áreas menores e mais homogêneas cultural e economicamente, onde é possível oferecer programação e publicidade ajustadas à realidade local.
De acordo com dados recentes do setor, a TVRO já contabiliza quase 14 milhões de receptores ativados, com uma penetração por domicílio particularmente forte nas regiões Norte e Nordeste, onde a cobertura terrestre ainda é limitada, e em função de programas como o Siga Antenado. Considerando, porém, as quantidades absolutas, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro foram os estados onde mais foram vendidos kits receptores. Todo esse avanço consolidou a base necessária para uma expansão da regionalização televisiva.
De 80 para 180 regiões
Até meados de 2024, o Brasil era dividido em cerca de 80 regiões de TVRO. Agora, o setor está em plena transição para 180 zonas de cobertura, processo que deve ser concluído até o fim de novembro. Essa multiplicação de regiões permite que grandes redes como Globo, SBT, Record e Band ampliem suas operações locais, descentralizando a produção, a veiculação de conteúdo e a publicidade.
Na prática, isso significa que emissoras que antes tinham um único sinal estadual passam a operar múltiplas versões regionais. O SBT, por exemplo, já conta com seis microrregiões em Minas Gerais, enquanto a Globo possui seis na Bahia e duas em Rondônia. A expectativa é que o número de regionais de cada emissora cresça significativamente em breve.
Novas oportunidades comerciais
A grande inovação trazida pelo micro regionalização é a possibilidade de veiculação de publicidade local via satélite. Até pouco tempo, um canal nacional só conseguia vender espaços publicitários para grandes marcas, algo restrito a cerca de 200 ou 300 anunciantes de peso nacional.
Agora, pequenos empreendedores podem anunciar em breaks comerciais regionais, aproveitando o mesmo espaço técnico das grandes redes. Um exemplo é o SBT Sul de Minas, onde pequenas marcas e empresários locais já anunciam em faixas locais de TV, algo inviável no antigo modelo de sinal nacional. Essa nova estrutura cria uma fonte adicional de receita para emissoras e afiliadas, ao mesmo tempo em que democratiza o acesso à mídia televisiva.
O modelo de Ariquemes: emissora sem sede física
Entre os casos mais emblemáticos está o de Ariquemes, em Rondônia, onde a Rede Amazônica, afiliada da Globo, criou um modelo experimental de micro emissora sem sede física. Com apenas dois profissionais locais, um vendedor e um repórter que produz conteúdo, o canal opera de forma totalmente remota: o sinal é captado e processado em Manaus, distribuído via satélite (banda Ku) tanto para parabólicas quanto para torres retransmissoras na região.
Esse modelo de baixo custo e alta eficiência pode se tornar referência para outras regiões com pouca infraestrutura, permitindo ampliar a presença da TV aberta mesmo em locais onde antes não havia viabilidade técnica ou financeira.
Micro regionalização da TVRO antecipa a chegada da TV 3.0
A micro regionalização antecipa a chegada da TV 3.0 (ou DTV+), o novo padrão que vai integrar a transmissão televisiva à internet e permitirá medição de audiência em tempo real, segmentação geográfica precisa e até inserção dinâmica de anúncios, criando uma ponte entre o broadcast tradicional e o ambiente digital.
Ainda que a adoção plena do DTV+ deva levar anos, o avanço do TVRO regionalizado mostra que o país já se prepara para esse futuro híbrido, onde a TV aberta se reinventa como plataforma de alcance e negócios locais.
O movimento de micro regionalização do TVRO marca uma virada estratégica no ecossistema de radiodifusão brasileiro. Mais do que uma atualização técnica, trata-se de uma mudança de paradigma, em que o satélite deixa de ser apenas um meio de distribuição massiva e passa a ser um vetor de inclusão e personalização regional, conectando milhões de brasileiros e abrindo espaço para uma nova economia de mídia descentralizada.


