Satélites: transformação, novas soluções e novas oportunidades

Satélites

O painel “Satélites: panorama do mercado nacional e internacional”, realizado durante a Futurecom 2024, contou com as presenças de Mauro Wajnberg (Abrasat), Fabio Alencar (Sindisat); Lincoln Oliveira (Star One Embratel); Juan Pablo Cofino (Eutelsat), e teve a moderação da jornalista Ana Paula Lobo. O painel ocorreu no último dia 10.

Para os participantes, o mercado de satélites está pujante, vivendo transformações que são o resultado de uma conjunção de fatores. Uma disrupção que é considerada positiva por todos, porque traz novas soluções e novas oportunidades.

“Só o fato de dois grandes grupos internacionais, das duas pessoas mais ricas do mundo, terem investido no mercado de satélites, demonstra a relevância dessa indústria e já chama a atenção de outros investidores para esse setor”, observou Fábio Alencar.

Sobre a chegada das constelações, os executivos consideram que o mercado é agnóstico. Todas as tecnologias são importantes e complementares. O Brasil já dispõe de uma série de empresas competidoras, graças à uma política positiva da Anatel de incentivo à competição, e todos acreditam que ainda há espaço para mais competidores.

“Com a chegada das constelações a indústria está se transformando e isso é bom porque estamos contando com novas soluções e novas oportunidades”, observou Lincoln Oliveira. No entanto, ele observa que a órbita baixa não é a única solução. “Essa tecnologia vai resolver muitas questões, mas não todas”.

Para Mauro Wajnberg, o aquecimento do mercado e a grande demanda são consequências de um cenário, que vem sendo chamado de New Space, e que se caracteriza pela conjunção de alguns fatores: novas tecnologias espaciais que se tornaram disponíveis, capital privado disponível e uma demanda enorme por serviços. “Essa conjunção de fatores levou a uma aceleração da inovação tecnológica muito importante”, diz.

O relacionamento da indústria com o governo

Na visão de Fábio Alencar, no Brasil o governo é um “cliente” importantíssimo e as operadoras de satélites estão à disposição para ajudá-lo a alcançar seus objetivos. Ele acredita que o satélite é uma tecnologia indispensável para qualquer governo de um país com as dimensões do Brasil.

Mas um ponto importante colocado pelos painelistas é a necessidade haver condições isonômicas de competição para todos os players. Lincoln Oliveira destacou a política de impostos que, em alguns casos, precisa ser repensada com o objetivo de fomentar a economia a partir da diminuição ou até isenção de alguns tipos de impostos. Um exemplo são as redes terrestres de gateways de satélites mais modernas. “Seria bom que essas redes tivessem impostos diferenciados porque muitas vezes, dependendo do tamanho da rede, o investimento necessário é tão alto quanto o investimento no satélite. Então isso leva muitos operadores internacionais a colocar os gateways fora do Brasil”, disse.

Fábio Alencar explica que hoje as operadoras pagam mais de 80% de imposto sobre o gateway no Brasil comparado com um número muito menor em qualquer país da América Latina. Ele lembra também que a medida provisória 1.018/2020 reduziu os valores das alíquotas do Fistel  para as estações de satélite e que ela vence em dezembro do ano que vem. “Na década de 80, quando as estações de satélites custavam milhares de dólares, cobrar algumas centenas de Reais fazia sentido. Hoje não faz sentido uma taxa de fiscalização maior até do que o valor da mensalidade da estação”, explicou.

Juan Cofino lembra que em outros mercados existem incentivos e formas criativas de lidar com impostos e que, nestes locais, a companhia utiliza estas isenções para realizar mais projetos, criando um círculo virtuoso. “Em alguns países da América Latina e nos Estados Unidos, os governos são mais flexível”, compara.

Preço e latência: dependem da aplicação

Uma das provocações colocadas durante o painel foi como desmistificar a percepção de que o satélite é caro, que tem muita latência e não oferece banda larga? Lincoln Oliveira explicou que a latência ganhou uma importância que ela muitas vezes não tem. “Latência é importante para algumas aplicações, não para todas. Sistemas geoestacionários, que têm latência maior, podem fazer excelentes atendimentos dentro das necessidades específicas do cliente”.

Um bom exemplo de como o tipo de aplicação importa é o broadcast, destacou Mauro Wajnberg. “O satélite é o meio mais barato que existe para mandar uma mesma informação para milhões de usuários. Por fibra será muito mais caro. Há 25 anos tínhamos quatro satélites geoestacionários estatais. Hoje, existem mais de 30, das mais diversas operadoras. Isso mostra como foi bem-sucedida a tecnologia satélite dentro do mercado brasileiro”.

Sobre preço, o executivo observa que todos os operadores sempre buscaram melhorar os preços. “Os satélites HTS usam uma tecnologia que multiplica a capacidade com o reuso de frequência, resultando em um ganho de escala. Esse ganho de escala aumenta a capacidade disponível em uma proporção muito maior do que o investimento necessário. Assim, consegue-se reduzir o preço de uma forma saudável”, exemplificou.

Para Lincoln Oliveira, a palavra “caro” precisa ser contextualizada corretamente para se entender o que realmente é caro. “O preço do satélite tem caído. Até por conta da disrupção que está ocorrendo nesta indústria. Mas isso nem sempre é positivo. Guerra de preços não é uma coisa boa. Ela é muito atrativa num primeiro momento para os consumidores. Mas o resultado é que muitos concorrentes acabam morrendo e sobram um ou dois. Passando a ser um monopólio. A partir daí os preços voltam a subir novamente. No longo prazo, a guerra de preços é nefasta.

Juan Cofino, concorda que preço e latência dependem da aplicação e que os clientes devem levar em conta outras características que tornem a solução atraente. Além disso, ele lembrou que fabricar uma constelação demanda bilhões de dólares em investimentos que devem ser recuperados. “Precisamos entender as demandas das verticais para monetizar os investimentos”, afirma.

D2D

“Tudo indica que no D2D como solução para celular direto do satélite não haverá uma competição, mas uma complementação entre operadores de satélites e terrestre”, acredita Lincoln Oliveira . “Porque quando o usuário estiver com seu celular no meio da cidade de São Paulo, ele vai usar o acesso terrestre; quando estiver numa área distante remota, poderá acessar o satélite e complementar a sua conexão”. Lincoln observa que existem duas maneiras de fazer o D2D. O operador de satélite pode usar frequências específicas do MSS, ou pode usar o espectro da operadora móvel. “Essa questão ainda está em discussão. Mas usar a banda da operadora móvel é a chave para ter volume, o que torna o negócio atrativo em termos de preço. Ao mesmo tempo, o uso de bandas específicas é mais limitado e talvez não consiga atingir milhões de assinantes”.

Mauro Wajnberg lembra que o D2D, além da comunicação por celular, também é comunicação para IoT, ou seja, é a comunicação direta de um device qualquer, não necessariamente celular, com uma constelação de satélites. “E aí a gente tem uma variedade enorme de aplicações: monitoração de energia elétrica, monitoramento de frotas, agricultura, gado, carros autônomos, entre muitas outras”.

Fábio Alencar acredita que o D2D não será realidade até 2026. Explica que é um defensor do backhaul. Para ele, enquanto os operadores terrestres não avançarem com a fibra para lugares mais distantes, até o interior da Amazônia, por exemplo, essa solução de parceria com o satélite parece interessante. “Mas a operação de satélite sozinha não se sustenta porque precisa de volume, e para ter volume é importante ter o mesmo preço do terrestre. Isso é muito difícil de um satélite sustentar se não tiver o apoio das operadoras de celular”.

Juan Cofino acredita que ainda há muito a ser definido em termos de regulação e também em relação ao modelo a ser adotado nessa área. “É um modelo que vai impactar grandes grupos e grandes investimentos das operadoras de telecom. Não sei como vai acontecer. Se acontecer, será complementar. Há um empurrão em alguns países, não acho que vai substituir a infraestrutura terrestre”, diz.